PÂNICO: COMPREENDER PARA CURAR
DO LIVRO "ADULTOS EM TERAPIA": CAPÍTULO 24 = PÂNICO: COMPREENDER PARA CURAR
Imagine-se dentro de um túnel escuro e sem fim, onde o ar parece rarefeito, o peito aperta, o coração dispara e o mundo ao redor perde o contorno. A mente grita, o corpo reage e o medo não tem nome - apenas presença. Para quem sofre com a Síndrome do Pânico, essa imagem não é metáfora: é vivência recorrente. Essas crises reais surgem de formas inesperadas e podem ocorrer várias vezes ao mês e, muitas vezes, levam a comportamentos de fuga ou busca imediata por ajuda.A Síndrome do
Pânico é um transtorno de ansiedade que se manifesta por meio de crises
intensas de terror súbito, aparentemente sem causa objetiva. São episódios
avassaladores que produzem taquicardia, falta de ar, sudorese, tontura,
formigamento, náusea, sensação de morte iminente ou de perder o controle. Para
muitos, a primeira crise é tão intensa que acaba levando ao pronto-socorro - e,
não raramente, os exames não acusam nenhuma alteração física. O corpo está em
alerta extremo, mas o perigo é invisível.
É essencial
diferenciar o pânico adaptativo - como reação frente a uma ameaça real, como um
assalto ou um acidente - da Síndrome do Pânico, que se caracteriza por crises
espontâneas, sem fator externo identificável. Quando o organismo dispara o
alarme sem motivo concreto, o sistema de defesa se transforma em armadilha. A
mente vive em hipervigilância, esperando a próxima crise. A vida passa a ser
organizada em função do medo. É um transtorno que se torna debilitante porque
passa a dominar a vida da pessoa, que viver constantemente em alerta, sente-se
como se estivesse sempre em risco de morte.
Muitas pessoas,
após algumas crises, começam a evitar locais públicos, transportes, filas,
encontros sociais. O medo do medo se instala. Trata-se de um medo
antecipatório, tão paralisante quanto o próprio episódio de pânico. Como um
alarme que dispara mesmo na ausência de fumaça, o cérebro do indivíduo passa a
emitir sinais de perigo em situações corriqueiras - e a pessoa passa a viver em
função desses sinais falsos.
A origem da
síndrome é multifatorial: pode incluir predisposição genética, traumas não
elaborados, acúmulo de estresse, dificuldades emocionais prolongadas ou mesmo
eventos aparentemente banais que funcionam como gatilhos. Biologicamente, há
uma desregulação nos sistemas neuroquímicos do cérebro, especialmente nos
circuitos ligados à amígdala, responsável por detectar ameaças. O corpo age
como se estivesse constantemente em perigo real.
Contudo, o mais
impactante nem sempre são os sintomas físicos, mas a sensação de impotência e
desamparo. Muitas vezes, a pessoa não entende o que está acontecendo e sente
vergonha de contar aos outros. É comum escutar no consultório: “Achei que
estivesse enlouquecendo”, “Ninguém me entende”, “Pensei que fosse morrer e
ninguém levou a sério”. Esse isolamento emocional é tão ou mais doloroso
que o próprio transtorno.
O ataque de pânico
inicia-se com um pensamento, muitas vezes imperceptível, que gera um mal-estar.
O corpo reage com sinais físicos - palpitação, sudorese, tremores - e a mente
interpreta esses sinais como prova de que algo terrível está prestes a
acontecer. Surge então um ciclo: pensamento → sintoma → interpretação catastrófica → mais sintoma. E assim o ciclo se
retroalimenta.
Uma metáfora útil
é a de um equilibrista caminhando sobre uma corda bamba, com olhos vendados e
ouvindo, ao fundo, vozes que gritam: “Você vai cair!”. Mesmo que tenha
equilíbrio, a sugestão do desastre o faz perder a confiança. O pânico funciona
assim: não é a realidade que causa a queda, mas a crença de que ela é
inevitável. O resultado é um ciclo vicioso entre pensamento, sensação e
comportamento.
Estar vivo, por si
só, se transforma em fonte constante de preocupação para quem sofre deste tipo
de ansiedade. A psicoterapia oferece um caminho de reencontro com o próprio
eixo. Mais do que reduzir sintomas, ela ajuda a compreender o que está por trás
da ansiedade extrema. O paciente é convidado a reconhecer os gatilhos
emocionais, a escutar seu corpo, a compreender seus padrões de pensamento e a
ressignificar vivências que foram cristalizadas como ameaças.
Diferentes
abordagens podem ser eficazes. A psicoterapia humanista, por exemplo, valoriza
o acolhimento empático e o fortalecimento da autonomia emocional. Já abordagens
cognitivas ajudam a identificar pensamentos distorcidos. O psicólogo poderá
ensinar técnicas de manejo da crise, como respiração diafragmática, mindfulness
e grounding. Essas técnicas visam ancorar o indivíduo no presente,
desativando o “modo de sobrevivência”.
Durante um
episódio, técnicas de enraizamento (grounding) podem ser de grande
ajuda. Elas consistem em ações simples, como nomear objetos ao redor, sentir
texturas, focar na respiração ou manter os pés firmemente no chão. Ao
direcionar a atenção para o corpo e para o ambiente externo, a mente se descola
da espiral catastrófica e encontra um ponto de estabilidade.
Perguntas como
“O que estou sentindo agora?”, “Meu corpo está realmente em perigo?”, “Há
alguma ameaça real?” ajudam a devolver à razão um papel ativo na contenção
da crise. Com o tempo e a prática, o pânico deixa de ser uma entidade
incontrolável e passa a ser um sintoma possível de ser gerenciado.
Um paciente, que
chamaremos de Eduardo, relatava ataques de pânico recorrentes ao entrar em
shoppings. Após algumas sessões, identificou-se que, na infância, ele havia se
perdido da mãe num desses ambientes. A memória foi soterrada por anos, mas a
carga emocional permaneceu. Quando, na vida adulta, voltava a esse local, o
corpo reagia como se revivesse a separação. Nomear esse evento, elaborá-lo com
o terapeuta e ressignificá-lo foi crucial para sua melhora.
Outra paciente,
Marina, tinha pânico de dirigir sozinha. Durante a psicoterapia, percebeu que
havia internalizado o medo da mãe, que sempre repetia uma frase muito comum: “Mulher
ao volante é perigo constante”. Ao tomar consciência de que carregava um
medo que não era seu, ela pode reavaliar sua capacidade real e recuperar a
confiança.
Embora a
psicoterapia seja essencial, casos mais graves podem requerer medicação.
Antidepressivos e ansiolíticos, prescritos por psiquiatras, auxiliam no
controle da hiperatividade cerebral e reduzem a frequência e intensidade das
crises. O ideal é que o uso seja acompanhado por tratamento psicoterapêutico,
de modo que o paciente não dependa da medicação como única forma de controle.
O pânico, embora
assustador, pode ser compreendido e transformado. Ele não é sinal de fraqueza
nem loucura, mas um pedido do corpo por cuidado. A escuta atenta, a informação
correta e o apoio terapêutico abrem caminhos para a autonomia e o bem-estar.
Recuperar-se do
pânico é reencontrar-se com o próprio centro. É aprender a reconhecer os
sinais, a cuidar de si com mais gentileza e a reconstruir, com coragem, a
confiança na própria capacidade de existir sem medo.
Paulo C. T. Ribeiro
Psicólogo Clínico, Autor, Maçom

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