PÂNICO: COMPREENDER PARA CURAR

DO LIVRO "ADULTOS EM TERAPIA": CAPÍTULO 24 = PÂNICO: COMPREENDER PARA CURAR

“O pânico não é medo do que vai acontecer. É medo de não saber o que está acontecendo”, 
Luciano Lutereau.

Imagine-se dentro de um túnel escuro e sem fim, onde o ar parece rarefeito, o peito aperta, o coração dispara e o mundo ao redor perde o contorno. A mente grita, o corpo reage e o medo não tem nome - apenas presença. Para quem sofre com a Síndrome do Pânico, essa imagem não é metáfora: é vivência recorrente. Essas crises reais surgem de formas inesperadas e podem ocorrer várias vezes ao mês e, muitas vezes, levam a comportamentos de fuga ou busca imediata por ajuda.

A Síndrome do Pânico é um transtorno de ansiedade que se manifesta por meio de crises intensas de terror súbito, aparentemente sem causa objetiva. São episódios avassaladores que produzem taquicardia, falta de ar, sudorese, tontura, formigamento, náusea, sensação de morte iminente ou de perder o controle. Para muitos, a primeira crise é tão intensa que acaba levando ao pronto-socorro - e, não raramente, os exames não acusam nenhuma alteração física. O corpo está em alerta extremo, mas o perigo é invisível.

É essencial diferenciar o pânico adaptativo - como reação frente a uma ameaça real, como um assalto ou um acidente - da Síndrome do Pânico, que se caracteriza por crises espontâneas, sem fator externo identificável. Quando o organismo dispara o alarme sem motivo concreto, o sistema de defesa se transforma em armadilha. A mente vive em hipervigilância, esperando a próxima crise. A vida passa a ser organizada em função do medo. É um transtorno que se torna debilitante porque passa a dominar a vida da pessoa, que viver constantemente em alerta, sente-se como se estivesse sempre em risco de morte.

Muitas pessoas, após algumas crises, começam a evitar locais públicos, transportes, filas, encontros sociais. O medo do medo se instala. Trata-se de um medo antecipatório, tão paralisante quanto o próprio episódio de pânico. Como um alarme que dispara mesmo na ausência de fumaça, o cérebro do indivíduo passa a emitir sinais de perigo em situações corriqueiras - e a pessoa passa a viver em função desses sinais falsos.

A origem da síndrome é multifatorial: pode incluir predisposição genética, traumas não elaborados, acúmulo de estresse, dificuldades emocionais prolongadas ou mesmo eventos aparentemente banais que funcionam como gatilhos. Biologicamente, há uma desregulação nos sistemas neuroquímicos do cérebro, especialmente nos circuitos ligados à amígdala, responsável por detectar ameaças. O corpo age como se estivesse constantemente em perigo real.

Contudo, o mais impactante nem sempre são os sintomas físicos, mas a sensação de impotência e desamparo. Muitas vezes, a pessoa não entende o que está acontecendo e sente vergonha de contar aos outros. É comum escutar no consultório: “Achei que estivesse enlouquecendo”, “Ninguém me entende”, “Pensei que fosse morrer e ninguém levou a sério”. Esse isolamento emocional é tão ou mais doloroso que o próprio transtorno.

O ataque de pânico inicia-se com um pensamento, muitas vezes imperceptível, que gera um mal-estar. O corpo reage com sinais físicos - palpitação, sudorese, tremores - e a mente interpreta esses sinais como prova de que algo terrível está prestes a acontecer. Surge então um ciclo: pensamento sintoma interpretação catastrófica mais sintoma. E assim o ciclo se retroalimenta.

Uma metáfora útil é a de um equilibrista caminhando sobre uma corda bamba, com olhos vendados e ouvindo, ao fundo, vozes que gritam: “Você vai cair!”. Mesmo que tenha equilíbrio, a sugestão do desastre o faz perder a confiança. O pânico funciona assim: não é a realidade que causa a queda, mas a crença de que ela é inevitável. O resultado é um ciclo vicioso entre pensamento, sensação e comportamento.

Estar vivo, por si só, se transforma em fonte constante de preocupação para quem sofre deste tipo de ansiedade. A psicoterapia oferece um caminho de reencontro com o próprio eixo. Mais do que reduzir sintomas, ela ajuda a compreender o que está por trás da ansiedade extrema. O paciente é convidado a reconhecer os gatilhos emocionais, a escutar seu corpo, a compreender seus padrões de pensamento e a ressignificar vivências que foram cristalizadas como ameaças.

Diferentes abordagens podem ser eficazes. A psicoterapia humanista, por exemplo, valoriza o acolhimento empático e o fortalecimento da autonomia emocional. Já abordagens cognitivas ajudam a identificar pensamentos distorcidos. O psicólogo poderá ensinar técnicas de manejo da crise, como respiração diafragmática, mindfulness e grounding. Essas técnicas visam ancorar o indivíduo no presente, desativando o “modo de sobrevivência”.

Durante um episódio, técnicas de enraizamento (grounding) podem ser de grande ajuda. Elas consistem em ações simples, como nomear objetos ao redor, sentir texturas, focar na respiração ou manter os pés firmemente no chão. Ao direcionar a atenção para o corpo e para o ambiente externo, a mente se descola da espiral catastrófica e encontra um ponto de estabilidade.

Perguntas como “O que estou sentindo agora?”, “Meu corpo está realmente em perigo?”, “Há alguma ameaça real?” ajudam a devolver à razão um papel ativo na contenção da crise. Com o tempo e a prática, o pânico deixa de ser uma entidade incontrolável e passa a ser um sintoma possível de ser gerenciado.

Um paciente, que chamaremos de Eduardo, relatava ataques de pânico recorrentes ao entrar em shoppings. Após algumas sessões, identificou-se que, na infância, ele havia se perdido da mãe num desses ambientes. A memória foi soterrada por anos, mas a carga emocional permaneceu. Quando, na vida adulta, voltava a esse local, o corpo reagia como se revivesse a separação. Nomear esse evento, elaborá-lo com o terapeuta e ressignificá-lo foi crucial para sua melhora.

Outra paciente, Marina, tinha pânico de dirigir sozinha. Durante a psicoterapia, percebeu que havia internalizado o medo da mãe, que sempre repetia uma frase muito comum: “Mulher ao volante é perigo constante”. Ao tomar consciência de que carregava um medo que não era seu, ela pode reavaliar sua capacidade real e recuperar a confiança.

Embora a psicoterapia seja essencial, casos mais graves podem requerer medicação. Antidepressivos e ansiolíticos, prescritos por psiquiatras, auxiliam no controle da hiperatividade cerebral e reduzem a frequência e intensidade das crises. O ideal é que o uso seja acompanhado por tratamento psicoterapêutico, de modo que o paciente não dependa da medicação como única forma de controle.

O pânico, embora assustador, pode ser compreendido e transformado. Ele não é sinal de fraqueza nem loucura, mas um pedido do corpo por cuidado. A escuta atenta, a informação correta e o apoio terapêutico abrem caminhos para a autonomia e o bem-estar.

Recuperar-se do pânico é reencontrar-se com o próprio centro. É aprender a reconhecer os sinais, a cuidar de si com mais gentileza e a reconstruir, com coragem, a confiança na própria capacidade de existir sem medo.

Se você sofre com pânico, saiba que não está sozinho - e que é possível atravessar esse túnel escuro. Com ajuda, luz e orientação, há uma saída. E do outro lado, há vida.

Paulo C. T. Ribeiro
Psicólogo Clínico, Autor, Maçom

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